O Luar de Janeiro já leu avondo sobre este tema e, recentemente, nos foros do Portal Galego da Língua (http://www.pglingua.org/) volveu-se falar no assunto, pois alguém comentou sobre a atualizaçom da Norma AGAL...
Coma sempre, a discussão foi azeda, ríspida e por vezes desrespeitosa. Num foro de pessoas civilizadas, como é o do Portal, ninguém devia "perder as estribeiras", de jeito que a coragem na defesa das ideias não devia virar carragem.
A discussão vem já de velho. Como é sabido, a norma AGAL parte de uma filosofia: as falas galegas (isto dito sem qualquer matiz pejorativo), como as portuguesas, podem ser entendidas como realizações de um mesmo sistema linguístico e, portanto, podem inserir-se numa norma, a galega, que seria assim mais uma variante de uma língua comum. Quer dizer, a norma galega seria, à par da portuguesa e da brasileira, mais uma das que conformam hoje, no mundo, a língua portuguesa (ou galega ou galego-portuguesa), como língua supranacional e pluricêntrica.
Diferentemente dela, a normativa RAG-ILG entende que o galego fai parte dum sistema linguístico (comum ao português e brasileiro), mas é uma língua diferente e, portanto, o padrão galego é autónomo e distinto ao das outras ramas do sistema. Ao menos assim foi entendido tradicionalmente polos defensores desta normativa.
Consequentemente com a sua posição, a AGAL entendeu que a norma galega, substancialmente comum com as outras do seu sistema linguístico, podia ser lida e considerada como a mesma língua por qualquer leitor luso-brasileiro. Ao cabo, o leitor português ou brasileiro estaria a ler um texto na sua própria língua. A norma galega conservaria peculiaridades da língua próprias da Galiza, como fai o português do Brasil, por exemplo, a respeito do de Portugal (pensemos na ausência do artigo com os possessivos, na colocação dos pronomes, etc) Entre as peculiaridades da Norma galega estaria a conservação etimológica das terminações próprias da língua medieval que unanimemente as falas galegas mantêm (-om, -am, -ao/-am, ladrom, pam, irmao/irmám), o digrafo -mh- em palavras como umha, nengumha, as formas verbais peculiares da Galiza (algumas delas presentes também em dialetos portugueses...), plurais em -ns (capitans, ladrons, irmaos/irmáns), etc. Como sabemos, o português de Portugal e do Brasil reduziu aquelas terminações em -ão, conservando os plurais a sua origem etimológica. Assim, o singular harmonizou em -ão (ladrão, pão, irmão) mas o plural conservou a origem (ladrões, pães, irmãos) ainda que a harmonização do singular trouxo, como bem explicava no foro do PGL o professor Dr. Fernando Venâncio, inúmeras confusões, ao ser esquecida a etimologia do singular, de que ainda são testemunhas os dicionários portugueses: verão/verãos, verões; guardião/guardiães, guardiões; vulcão/vulcões, vulcães, vulcãos. Com frequência esta confusão fizo com que as formas não etimológicas se fossem impondo na prática: verões, guardiões, vulcões... No entanto, a norma galega conserva na escrita a memória da origem da palavra, de maneira que o leitor galego sabe que o plural de vulcam é vulcans, de verao é veraos, de guardiam é guardians (ou verãos, guardiães, vulcães como despois chegou a admitir a própria AGAL) O professor Fernando Venâncio alertava, no foro do PGL, para o perigo de o galego vir a cair na mesma confusão que caracterizou o português durante vários séculos como consequência daquela unificação no singular, e propugnava os galegos conservarem na escrita, e não só na oralidade, as terminações que a norma AGAL mantém. E não lhe faltava razão...
Ora, o Luar de Janeiro lembra mui bem, porque já vai tendo os seus anos, como algumas publicações reintegracionistas começárom a afastar-se dessa prescrição da AGAL e começárom a defender o uso do til, primeiro só nos plurais e em casos em que a etimologia o demandava (ladrom, pam, irmão/ladrões, pães, irmãos), despois quijo-se chegar a uma solução intermédia no singular (ladrom, pãm, guardiãm, irmão) e finalmente acabárom por reduzir no singular tudo para -ão, seguindo neste ponto a norma portuguesa e brasileira: ladrão, pão, irmão/ladrões, pães, irmãos. O Luar lembra muito bem, no II Congresso Internacional da Língua Galego-Portuguesa na Galiza, alá polo ano de 1987, como um grupo de professores organizaram uma espécie de reunião paralela onde proclamavam a sua adesão ao Acordo Ortográfico de 1986, esse que suprimira os acentos e despois deu em nada... Nessa reunião, o Professor Isaac Alonso Estravis apresentou o seu Estudos Filológicos Galego-Portugueses, livro que o Luar leu e releu naqueles anos de tenra juventude...
Argumentavam estes que a unificação ortográfica devia ser total, e que escrever -ão faria com que os falantes luso-brasileiros nos lessem melhor, inseriria o galego dentro da lusofonia de pleno direito, e não impedia que os galegos seguissem pronunciando como sempre: assim, ladrão, pão, irmão, não, na Galiza leriam-se: ladrom, pam, irmao/irmam/irmão, nom, etc.
A partir daí, mais ou menos recorrentemente, houvo sempre um enfrontamento entre os partidários de -om e os partidários de -ão. O número dos -ãoistas foi em aumento, ao ponto que a Comissom Línguística da AGAL acabou por aceitar o til de nasalidade como possibilidade nos plurais e nos casos etimologicamente justificados: ladrom, pam, irmão/ladrões, pães, irmãos. Os partidários do -ão pedírom mais, mas a Comissom já não cedeu (No número 19 da revista Agália está a resposta da Comissom).
Uma solução intermédia foi a ensaiada no dicionário e-estraviz. Nele, mantêm-se os galeguismos -om, -am, -ão, polo, che/te, cousa, fazendo os plurais em -ões, -ães, -ãos e desaparecendo umha que passaria para uma, e propugnava as formas verbais portuguesas: disse, fiz, fez em lugar das peculiares da Galiza dixo, figem/fizem, fijo/fizo...
Podemos sintetizar os argumentos de uma e outra postura, muito brevemente:
-OMistas: fidelidade às falas galegas, a unidade da língua não deve impedir a sua diversidade, e manter esta peculiaridade galega é enriquecedor, evitando confusões nos plurais e o possível esquecimento das formas próprias da oralidade galega, se não se virem reflectidas na escrita. Com efeito, grafar tudo em -ão implica introduzir uma alteração na morfologia e fonética alheia à variedade galega da língua comum, que deve ser respeitada como a brasileira fai com as suas peculiaridades. A norma galega seria assim pedagógica, achegada à realidade do galego atual, e internacional, por ser substancialmente lusófona. Ninguém poderia acusar os reintegracionistas de entreguistas ou mimeticamente adotantes de tudo quanto soe a português...
-ÃOistas: uma cousa é falar, outra escrever. Grafar tudo em -ão não impede que cada pessoa pronuncie como quiger (de facto, não hai uma única pronúncia galega, pois dentro do próprio galego há várias pronúncias possíveis: por exemplo, corações pode realizar-se como coraçons, coraçôs, coraçois, coraçoes, corações...). A escrita nem sempre pode ser fonológica. Antes, quanto mais suprafonológica for, melhor. Por exemplo, pense-se na escrita inglesa, bastante distante da sua dicção, mais do que a portuguesa, e se nada impede aos ingleses escreverem e pronunciarem corretamente, nada impede tampouco aos galegos escreverem da forma comum, ainda que a sua pronúncia se mantenha como tradicionalmente foi conservada. Hai, continuam, variedades do português onde se mantêm pronúncias semelhantes às galegas, mas isso não impede uma grafia comum, etc. O discurso de manter as peculiaridades galegas acaba por ser análogo ao dos isolacionistas e acaba por implicar uma consideração do galego como língua diferente do português... Até, houvo quem chegou a dizer que a norma AGAL era uma variedade mais do Portunhol semelhante ao Portunhol do ILG-RAG (num exagero mais do que evidente ao ver do Luar...) Quanto às acusações de radicalismo antipedagógico que lhes fam os partidários da norma AGAL, eles respondem que não hai nada que impeça os galegos escreverem português, e acusam os seus contrários, até, de complexo de inferioridade, ao considerarem os galegos incapazes de chegarem a dominar a ortografia do português (-Porque não podemos escrever em português? tão burros e pouco inteligentes somos?-chegam a dizer-)
Estes autores aderírom posteriormente o Acordo Ortográfico de 1990, que têm praticado até agora, depois da experiência falida do de 1986, e que já foi vigorado em Portugal.
Antes de continuarmos, o Luar quer recomendar a leitura do artigo de José Henrique Peres Rodrigues, muito esclarecedor, intitulado "A Escrita e a Norma cara ao Século XXI", no número65/66 da Agália, do primeiro semestre de 2001. Explica, muito melhor ca mim, e mais por extenso e polo miúdo, a polémica e os argumentos de uns e de outros.
A controvérsia chegou frequentemente à desqualificação e até ao insulto, encirrando os ânimos numa animadversão que fai ao Luar ficar perplexo..., gerando divisões no seio do reintegracionismo, que em nada o favorecem.
Ora, a cousa dista de ser tão simples, porque dentro de uma e outra tendência hai matizes: pensemos que os hai que escrevem com -ão mas com formas verbais galegas, ou com -om e formas verbais portuguesas. Hai, ainda, quem considerou a necessidade de inserir as falas galegas dentro do padrão português, ao ponto de ser a norma de Lisboa o referente da Galiza. O sonho destes poderia sintetizar-se numa Galiza mais ou menos integrada politicamente em Portugal, e a RTP (televisão portuguesa) a impor a norma lisboeta varrendo triunfalmente -qual novo D. Afonso Enriques dacavalo, de espada à mão e lança em riste- falas transminhotas, como já fizera com tanta variedade linguística que esmoreceu dentro do próprio Portugal... Por isso, talvez devamos falar de um continuum que vai da norma AGAL na sua versão originária (-om, -am, -ao/-ons, -ans, -aos), até os partidários do padrão português (até com formas verbais portuguesas, pelo pela, em lugar de polo, pola, dois coisa em lugar de dous cousa), que os hai e senão vede algumas das obras de autores moços galegos da coleção de poesia de Cadernos do Povo, Nós, O Ensino...
A tendência -omista da norma AGAL foi recentemente atualizada (A famosa Atualizaçom de que aqui já se falou) para se adatar ao Acordo Ortográfico de 1990, que finalmente foi vigorado em Portugal como já ficou dito.
Portanto, por clareza, distinguiremos entre a Norma Galega da AGAL adatada ao Acordo Ortográfico de 1990, e a norma dos (-ãoistas) partidários do mesmo Acordo Ortográfico, os quais, entre as possibilidades que deixa o Acordo, e perante a ausência de uma norma ortofónica própria da Galiza, se acolhem à norma portuguesa do Acordo (Acordo que permite certa flexibilidade dependendo das pronúncias, consagrando, longe da unidade total, como já advertiu o professor Venâncio, a possibilidade de existência de uma norma portuguesa e outra brasileira, acolhendo-se os -ãoistas galegos à portuguesa por razões práticas fundamentalmente) Esta última linha concretizou-se à volta da recentemente criada Academia Galega da Língua Portuguesa.
Chamaremos à primeira norma AGAL atualizada (entendida na versão mais moderna, a que admitiu o til de nasalidade em irmão, ladrões, pães, irmãos) e à segunda Acordo Ortográfico (AO)
Despois do exposto o Luar deve dizer que tem experimentado, ao longo dos anos, na sua escrita, todas as possibilidades da Norma Agal, atualizada ou não, em versão primeira ou modernizada, bem como de AO. E isto com muitas vacilações, num percurso semelhante, julga, ao de muitos galegos. Leu argumentos e contra-argumentos e, passado o tempo, acabou por pensar que havia razões para ambas as linhas de pensamento. Todos tinham a sua parte de razão, se bem que posturas extremas, como pensar que o galego é conjunto de falas vulgares, que convém uniformar recorrendo ao padrão de Lisboa, ou pensar que a norma AGAL não é português, mas uma versão esquisita do galego isolacionista, devem ser rejeitadas.
Como clarificar a questão? São realmente tão diferentes as duas posturas?
Se ambas as posturas rejeitam o galego espanholizado do ILG-RAG, se ambas as posturas pensam que galego e português são ou, ao menos, podem ser entendidas, como variantes da mesma língua, se igualmente observamos que hai, realmente, um continuum entre uma e outra posição, mas que todos defendem a mesma filosofia, fora posturas radicais e acusações sem fundamento, porque tanta visceralidade?
O Luar pensa, na realidade, que uma vez vigorado o Acordo, e sendo já inevitável a sua aplicação, atualizada já a Norma AGAL, consoante ao Acordo, a Norma AGAL atualizada e AO são, realmente, a mesma norma (melhor ou pior construídas, pois já ficou dito aqui como os critérios da Atualizaçom não parecem os mais afortunados e, por outra parte, não parece muito lógico acolher-se ao AO versão Lisboa em lugar de procurar uma versão galega do Acordo dentro do seu espírito, como com fortuna pouca tentou a Comissom Linguística da AGAL) Pondo uma e outra (AGAL e AO) o ênfase em mais ou menos peculiaridades galegas, no fundo são a mesma cousa. O galego é uma variante (com mais ou menos personalidade) dentro da língua comum. Essa é a filosofia que ambas as duas tendências reintegracionistas seguem: galego e português, a mesma língua. Porque, já que logo, tanta genreira?
Coma sempre, a discussão foi azeda, ríspida e por vezes desrespeitosa. Num foro de pessoas civilizadas, como é o do Portal, ninguém devia "perder as estribeiras", de jeito que a coragem na defesa das ideias não devia virar carragem.
A discussão vem já de velho. Como é sabido, a norma AGAL parte de uma filosofia: as falas galegas (isto dito sem qualquer matiz pejorativo), como as portuguesas, podem ser entendidas como realizações de um mesmo sistema linguístico e, portanto, podem inserir-se numa norma, a galega, que seria assim mais uma variante de uma língua comum. Quer dizer, a norma galega seria, à par da portuguesa e da brasileira, mais uma das que conformam hoje, no mundo, a língua portuguesa (ou galega ou galego-portuguesa), como língua supranacional e pluricêntrica.
Diferentemente dela, a normativa RAG-ILG entende que o galego fai parte dum sistema linguístico (comum ao português e brasileiro), mas é uma língua diferente e, portanto, o padrão galego é autónomo e distinto ao das outras ramas do sistema. Ao menos assim foi entendido tradicionalmente polos defensores desta normativa.
Consequentemente com a sua posição, a AGAL entendeu que a norma galega, substancialmente comum com as outras do seu sistema linguístico, podia ser lida e considerada como a mesma língua por qualquer leitor luso-brasileiro. Ao cabo, o leitor português ou brasileiro estaria a ler um texto na sua própria língua. A norma galega conservaria peculiaridades da língua próprias da Galiza, como fai o português do Brasil, por exemplo, a respeito do de Portugal (pensemos na ausência do artigo com os possessivos, na colocação dos pronomes, etc) Entre as peculiaridades da Norma galega estaria a conservação etimológica das terminações próprias da língua medieval que unanimemente as falas galegas mantêm (-om, -am, -ao/-am, ladrom, pam, irmao/irmám), o digrafo -mh- em palavras como umha, nengumha, as formas verbais peculiares da Galiza (algumas delas presentes também em dialetos portugueses...), plurais em -ns (capitans, ladrons, irmaos/irmáns), etc. Como sabemos, o português de Portugal e do Brasil reduziu aquelas terminações em -ão, conservando os plurais a sua origem etimológica. Assim, o singular harmonizou em -ão (ladrão, pão, irmão) mas o plural conservou a origem (ladrões, pães, irmãos) ainda que a harmonização do singular trouxo, como bem explicava no foro do PGL o professor Dr. Fernando Venâncio, inúmeras confusões, ao ser esquecida a etimologia do singular, de que ainda são testemunhas os dicionários portugueses: verão/verãos, verões; guardião/guardiães, guardiões; vulcão/vulcões, vulcães, vulcãos. Com frequência esta confusão fizo com que as formas não etimológicas se fossem impondo na prática: verões, guardiões, vulcões... No entanto, a norma galega conserva na escrita a memória da origem da palavra, de maneira que o leitor galego sabe que o plural de vulcam é vulcans, de verao é veraos, de guardiam é guardians (ou verãos, guardiães, vulcães como despois chegou a admitir a própria AGAL) O professor Fernando Venâncio alertava, no foro do PGL, para o perigo de o galego vir a cair na mesma confusão que caracterizou o português durante vários séculos como consequência daquela unificação no singular, e propugnava os galegos conservarem na escrita, e não só na oralidade, as terminações que a norma AGAL mantém. E não lhe faltava razão...
Ora, o Luar de Janeiro lembra mui bem, porque já vai tendo os seus anos, como algumas publicações reintegracionistas começárom a afastar-se dessa prescrição da AGAL e começárom a defender o uso do til, primeiro só nos plurais e em casos em que a etimologia o demandava (ladrom, pam, irmão/ladrões, pães, irmãos), despois quijo-se chegar a uma solução intermédia no singular (ladrom, pãm, guardiãm, irmão) e finalmente acabárom por reduzir no singular tudo para -ão, seguindo neste ponto a norma portuguesa e brasileira: ladrão, pão, irmão/ladrões, pães, irmãos. O Luar lembra muito bem, no II Congresso Internacional da Língua Galego-Portuguesa na Galiza, alá polo ano de 1987, como um grupo de professores organizaram uma espécie de reunião paralela onde proclamavam a sua adesão ao Acordo Ortográfico de 1986, esse que suprimira os acentos e despois deu em nada... Nessa reunião, o Professor Isaac Alonso Estravis apresentou o seu Estudos Filológicos Galego-Portugueses, livro que o Luar leu e releu naqueles anos de tenra juventude...
Argumentavam estes que a unificação ortográfica devia ser total, e que escrever -ão faria com que os falantes luso-brasileiros nos lessem melhor, inseriria o galego dentro da lusofonia de pleno direito, e não impedia que os galegos seguissem pronunciando como sempre: assim, ladrão, pão, irmão, não, na Galiza leriam-se: ladrom, pam, irmao/irmam/irmão, nom, etc.
A partir daí, mais ou menos recorrentemente, houvo sempre um enfrontamento entre os partidários de -om e os partidários de -ão. O número dos -ãoistas foi em aumento, ao ponto que a Comissom Línguística da AGAL acabou por aceitar o til de nasalidade como possibilidade nos plurais e nos casos etimologicamente justificados: ladrom, pam, irmão/ladrões, pães, irmãos. Os partidários do -ão pedírom mais, mas a Comissom já não cedeu (No número 19 da revista Agália está a resposta da Comissom).
Uma solução intermédia foi a ensaiada no dicionário e-estraviz. Nele, mantêm-se os galeguismos -om, -am, -ão, polo, che/te, cousa, fazendo os plurais em -ões, -ães, -ãos e desaparecendo umha que passaria para uma, e propugnava as formas verbais portuguesas: disse, fiz, fez em lugar das peculiares da Galiza dixo, figem/fizem, fijo/fizo...
Podemos sintetizar os argumentos de uma e outra postura, muito brevemente:
-OMistas: fidelidade às falas galegas, a unidade da língua não deve impedir a sua diversidade, e manter esta peculiaridade galega é enriquecedor, evitando confusões nos plurais e o possível esquecimento das formas próprias da oralidade galega, se não se virem reflectidas na escrita. Com efeito, grafar tudo em -ão implica introduzir uma alteração na morfologia e fonética alheia à variedade galega da língua comum, que deve ser respeitada como a brasileira fai com as suas peculiaridades. A norma galega seria assim pedagógica, achegada à realidade do galego atual, e internacional, por ser substancialmente lusófona. Ninguém poderia acusar os reintegracionistas de entreguistas ou mimeticamente adotantes de tudo quanto soe a português...
-ÃOistas: uma cousa é falar, outra escrever. Grafar tudo em -ão não impede que cada pessoa pronuncie como quiger (de facto, não hai uma única pronúncia galega, pois dentro do próprio galego há várias pronúncias possíveis: por exemplo, corações pode realizar-se como coraçons, coraçôs, coraçois, coraçoes, corações...). A escrita nem sempre pode ser fonológica. Antes, quanto mais suprafonológica for, melhor. Por exemplo, pense-se na escrita inglesa, bastante distante da sua dicção, mais do que a portuguesa, e se nada impede aos ingleses escreverem e pronunciarem corretamente, nada impede tampouco aos galegos escreverem da forma comum, ainda que a sua pronúncia se mantenha como tradicionalmente foi conservada. Hai, continuam, variedades do português onde se mantêm pronúncias semelhantes às galegas, mas isso não impede uma grafia comum, etc. O discurso de manter as peculiaridades galegas acaba por ser análogo ao dos isolacionistas e acaba por implicar uma consideração do galego como língua diferente do português... Até, houvo quem chegou a dizer que a norma AGAL era uma variedade mais do Portunhol semelhante ao Portunhol do ILG-RAG (num exagero mais do que evidente ao ver do Luar...) Quanto às acusações de radicalismo antipedagógico que lhes fam os partidários da norma AGAL, eles respondem que não hai nada que impeça os galegos escreverem português, e acusam os seus contrários, até, de complexo de inferioridade, ao considerarem os galegos incapazes de chegarem a dominar a ortografia do português (-Porque não podemos escrever em português? tão burros e pouco inteligentes somos?-chegam a dizer-)
Estes autores aderírom posteriormente o Acordo Ortográfico de 1990, que têm praticado até agora, depois da experiência falida do de 1986, e que já foi vigorado em Portugal.
Antes de continuarmos, o Luar quer recomendar a leitura do artigo de José Henrique Peres Rodrigues, muito esclarecedor, intitulado "A Escrita e a Norma cara ao Século XXI", no número65/66 da Agália, do primeiro semestre de 2001. Explica, muito melhor ca mim, e mais por extenso e polo miúdo, a polémica e os argumentos de uns e de outros.
A controvérsia chegou frequentemente à desqualificação e até ao insulto, encirrando os ânimos numa animadversão que fai ao Luar ficar perplexo..., gerando divisões no seio do reintegracionismo, que em nada o favorecem.
Ora, a cousa dista de ser tão simples, porque dentro de uma e outra tendência hai matizes: pensemos que os hai que escrevem com -ão mas com formas verbais galegas, ou com -om e formas verbais portuguesas. Hai, ainda, quem considerou a necessidade de inserir as falas galegas dentro do padrão português, ao ponto de ser a norma de Lisboa o referente da Galiza. O sonho destes poderia sintetizar-se numa Galiza mais ou menos integrada politicamente em Portugal, e a RTP (televisão portuguesa) a impor a norma lisboeta varrendo triunfalmente -qual novo D. Afonso Enriques dacavalo, de espada à mão e lança em riste- falas transminhotas, como já fizera com tanta variedade linguística que esmoreceu dentro do próprio Portugal... Por isso, talvez devamos falar de um continuum que vai da norma AGAL na sua versão originária (-om, -am, -ao/-ons, -ans, -aos), até os partidários do padrão português (até com formas verbais portuguesas, pelo pela, em lugar de polo, pola, dois coisa em lugar de dous cousa), que os hai e senão vede algumas das obras de autores moços galegos da coleção de poesia de Cadernos do Povo, Nós, O Ensino...
A tendência -omista da norma AGAL foi recentemente atualizada (A famosa Atualizaçom de que aqui já se falou) para se adatar ao Acordo Ortográfico de 1990, que finalmente foi vigorado em Portugal como já ficou dito.
Portanto, por clareza, distinguiremos entre a Norma Galega da AGAL adatada ao Acordo Ortográfico de 1990, e a norma dos (-ãoistas) partidários do mesmo Acordo Ortográfico, os quais, entre as possibilidades que deixa o Acordo, e perante a ausência de uma norma ortofónica própria da Galiza, se acolhem à norma portuguesa do Acordo (Acordo que permite certa flexibilidade dependendo das pronúncias, consagrando, longe da unidade total, como já advertiu o professor Venâncio, a possibilidade de existência de uma norma portuguesa e outra brasileira, acolhendo-se os -ãoistas galegos à portuguesa por razões práticas fundamentalmente) Esta última linha concretizou-se à volta da recentemente criada Academia Galega da Língua Portuguesa.
Chamaremos à primeira norma AGAL atualizada (entendida na versão mais moderna, a que admitiu o til de nasalidade em irmão, ladrões, pães, irmãos) e à segunda Acordo Ortográfico (AO)
Despois do exposto o Luar deve dizer que tem experimentado, ao longo dos anos, na sua escrita, todas as possibilidades da Norma Agal, atualizada ou não, em versão primeira ou modernizada, bem como de AO. E isto com muitas vacilações, num percurso semelhante, julga, ao de muitos galegos. Leu argumentos e contra-argumentos e, passado o tempo, acabou por pensar que havia razões para ambas as linhas de pensamento. Todos tinham a sua parte de razão, se bem que posturas extremas, como pensar que o galego é conjunto de falas vulgares, que convém uniformar recorrendo ao padrão de Lisboa, ou pensar que a norma AGAL não é português, mas uma versão esquisita do galego isolacionista, devem ser rejeitadas.
Como clarificar a questão? São realmente tão diferentes as duas posturas?
Se ambas as posturas rejeitam o galego espanholizado do ILG-RAG, se ambas as posturas pensam que galego e português são ou, ao menos, podem ser entendidas, como variantes da mesma língua, se igualmente observamos que hai, realmente, um continuum entre uma e outra posição, mas que todos defendem a mesma filosofia, fora posturas radicais e acusações sem fundamento, porque tanta visceralidade?
O Luar pensa, na realidade, que uma vez vigorado o Acordo, e sendo já inevitável a sua aplicação, atualizada já a Norma AGAL, consoante ao Acordo, a Norma AGAL atualizada e AO são, realmente, a mesma norma (melhor ou pior construídas, pois já ficou dito aqui como os critérios da Atualizaçom não parecem os mais afortunados e, por outra parte, não parece muito lógico acolher-se ao AO versão Lisboa em lugar de procurar uma versão galega do Acordo dentro do seu espírito, como com fortuna pouca tentou a Comissom Linguística da AGAL) Pondo uma e outra (AGAL e AO) o ênfase em mais ou menos peculiaridades galegas, no fundo são a mesma cousa. O galego é uma variante (com mais ou menos personalidade) dentro da língua comum. Essa é a filosofia que ambas as duas tendências reintegracionistas seguem: galego e português, a mesma língua. Porque, já que logo, tanta genreira?
Mas as peculiaridades e as variantes podem conviver dentro duma mesma norma. Acontece na fala, e pode acontecer na escrita. Na língua castelã, os argentinos têm as suas próprias formas verbais (vos tenés é o mesmo que em Espanha tú tienes; ustedes tienen é o mesmo que em Espanha vosotros tenéis). Na página da Real Academia Espanhola (http://www.rae.es/), se clicarmos na conjugação de um verbo, aparecem as variantes argentinas à par das comuns. Na imprensa argentina, no cinema, achamos estas variantes, mas eles também conhecem as formas comuns e podem utilizá-las chegado o momento, e segundo o contexto.
Nada impede, portanto, os galegos fazerem o próprio. Os galegos aprenderiam a ler e a escrever com os seus -om, -ám, formas verbais, umha, que não só pronunciariam, mas também escreveriam, não perdendo assim a sua riqueza e peculiaridade galega. Depois o ensino mais avançado iria advertindo da existência de outras formas verbais que também são e fôrom galegas, mas que hoje não são correntemente empregues na Galiza, fazendo parte, porém, da versão mais internacional do seu idioma. E aprenderiam que reduzindo, na escrita que já praticam, -om, -am, -ão, para -ão, o seu galego adquere a feição mais internacional possível. Não perderiam a riqueza da sua morfologia, conheceriam perfeitamente qual é a pronúncia e realização, galega e etimológica, de ladrão, pão e irmão, porque assim a aprendêrom na escrita e continuam a empregar em todos os aspetos quotidianos do seu ler e escrever (ladrom, pam, irmão, que lhes seriam tão familiares como ladrão, pão e irmão) Leriam e interpretariam corretamente qualquer texto lusófono, vinhesse de onde vinhesse. Não duvidariam nunca sobre qual o plural de verão, guardião, irmão... Conheceriam as variantes portuguesas e brasileiras e, fora certas peculiaridades a que nunca renunciariam, como formas verbais, polo, pola, cousa, dous, te/che, etc, marcas sempre presentes de galeguidade, adatariam a sua escrita ao contexto, de maneira que usariam mais ou menos peculiaridades próprias da variante galega consoante o ambiente e a natureza do que escrevem (não é igual um texto literário, jornalístico, epistolar, íntimo...que um texto científico)
Cuido que, deste jeito, se poderia superar esta polémica que tantas forças desaproveitou para a luita fundamental que o reintegracionismo tem de conseguir cara ao futuro e como, ao ver do Luar, derradeira esperança do galeguismo: reunir um número de utentes tal que consigam uma mudança no Poder galego, orientada primeiro a um binormativismo em que a norma reintegrada seja tolerada polo Poder, para deixar concorrer livremente isolacionismo e reintegracionismo, em igualdade de condições. De ocorrer esta hipótese, o resultado não devia deitar dúvidas sobre qual será a linha triunfante: para o Luar de Janeiro acabaria por ser o reintegracionismo...
E isto sem dogmatismos nem desqualificações. Sem excluir qualquer cousa vinda do isolacionismo por ela vir de onde vém, aproveitando o aproveitável que sem dúvida é muito, adatando-o ao nosso jeito de entender a língua.
Doutra banda, não se pode perder de vista o percurso ideológico do isolacionismo que, lentamente, se encaminha cara a convergência com o português. De facto, já advertiu o professor Fernando Venâncio como no léxico os avanços no campo isolacionista são cada vez mais patentes adotando terminologia do Além-Minho, e mesmo rejeitando castelanismos hai séculos presentes na norma portuguesa...
Portanto, aos isolacionistas hai que deixá-los fazer, ao seu ritmo, sem dogmatismos e com posturas conciliadoras, tentando atrair para o campo reintegracionista quantos mais deles melhor. E outro tanto acontece com os chamados "reintegracionistas platónicos", alguns dos quais praticam já, até, o chamado binormativismo (Camilo Nogueira, Suso de Toro, Pilar Garcia Negro, Freixeiro Mato...) Hai que os respeitar aceitândomos como nossas as suas obras, em lugar de os criticarmos. Cada quem precisa o seu ritmo e seguir o seu próprio percurso e caminho. E os reintegracionistas têm de atrair e gerar simpatia e curiosidade, e não animadversão ou ódio.
O tempo dirá, pero o Luar de Janeiro vê que isto já é tema para outra entrada neste blogue desvairado... E prefere falar de estratégias noutra ocasião, que polo de hoje já chega.
Grato pola atenção.
Nada impede, portanto, os galegos fazerem o próprio. Os galegos aprenderiam a ler e a escrever com os seus -om, -ám, formas verbais, umha, que não só pronunciariam, mas também escreveriam, não perdendo assim a sua riqueza e peculiaridade galega. Depois o ensino mais avançado iria advertindo da existência de outras formas verbais que também são e fôrom galegas, mas que hoje não são correntemente empregues na Galiza, fazendo parte, porém, da versão mais internacional do seu idioma. E aprenderiam que reduzindo, na escrita que já praticam, -om, -am, -ão, para -ão, o seu galego adquere a feição mais internacional possível. Não perderiam a riqueza da sua morfologia, conheceriam perfeitamente qual é a pronúncia e realização, galega e etimológica, de ladrão, pão e irmão, porque assim a aprendêrom na escrita e continuam a empregar em todos os aspetos quotidianos do seu ler e escrever (ladrom, pam, irmão, que lhes seriam tão familiares como ladrão, pão e irmão) Leriam e interpretariam corretamente qualquer texto lusófono, vinhesse de onde vinhesse. Não duvidariam nunca sobre qual o plural de verão, guardião, irmão... Conheceriam as variantes portuguesas e brasileiras e, fora certas peculiaridades a que nunca renunciariam, como formas verbais, polo, pola, cousa, dous, te/che, etc, marcas sempre presentes de galeguidade, adatariam a sua escrita ao contexto, de maneira que usariam mais ou menos peculiaridades próprias da variante galega consoante o ambiente e a natureza do que escrevem (não é igual um texto literário, jornalístico, epistolar, íntimo...que um texto científico)
Cuido que, deste jeito, se poderia superar esta polémica que tantas forças desaproveitou para a luita fundamental que o reintegracionismo tem de conseguir cara ao futuro e como, ao ver do Luar, derradeira esperança do galeguismo: reunir um número de utentes tal que consigam uma mudança no Poder galego, orientada primeiro a um binormativismo em que a norma reintegrada seja tolerada polo Poder, para deixar concorrer livremente isolacionismo e reintegracionismo, em igualdade de condições. De ocorrer esta hipótese, o resultado não devia deitar dúvidas sobre qual será a linha triunfante: para o Luar de Janeiro acabaria por ser o reintegracionismo...
E isto sem dogmatismos nem desqualificações. Sem excluir qualquer cousa vinda do isolacionismo por ela vir de onde vém, aproveitando o aproveitável que sem dúvida é muito, adatando-o ao nosso jeito de entender a língua.
Doutra banda, não se pode perder de vista o percurso ideológico do isolacionismo que, lentamente, se encaminha cara a convergência com o português. De facto, já advertiu o professor Fernando Venâncio como no léxico os avanços no campo isolacionista são cada vez mais patentes adotando terminologia do Além-Minho, e mesmo rejeitando castelanismos hai séculos presentes na norma portuguesa...
Portanto, aos isolacionistas hai que deixá-los fazer, ao seu ritmo, sem dogmatismos e com posturas conciliadoras, tentando atrair para o campo reintegracionista quantos mais deles melhor. E outro tanto acontece com os chamados "reintegracionistas platónicos", alguns dos quais praticam já, até, o chamado binormativismo (Camilo Nogueira, Suso de Toro, Pilar Garcia Negro, Freixeiro Mato...) Hai que os respeitar aceitândomos como nossas as suas obras, em lugar de os criticarmos. Cada quem precisa o seu ritmo e seguir o seu próprio percurso e caminho. E os reintegracionistas têm de atrair e gerar simpatia e curiosidade, e não animadversão ou ódio.
O tempo dirá, pero o Luar de Janeiro vê que isto já é tema para outra entrada neste blogue desvairado... E prefere falar de estratégias noutra ocasião, que polo de hoje já chega.
Grato pola atenção.